MPTO debate desafios e oportunidades do sistema prisional brasileiro em simpósio
Integrantes do Ministério Público do Tocantins (MPTO) reuniram-se na última sexta-feira, 6, para o simpósio "A Pena no Estado Democrático de Direito: Respeitabilidade, Justiça e Legitimidade". O evento, que buscou aprofundar o debate sobre a pena e a busca por um sistema penal mais justo e eficaz, destacou a complexidade da realidade carcerária brasileira e a urgência de soluções para a efetiva ressocialização.
Organizado pelo Centro de Apoio Operacional Criminal (Caocrim) e pelo Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional - Escola Superior do Ministério Público (Cesaf-ESMP), o simpósio trouxe à tona discussões importantes sobre o papel da pena e a aplicação da Lei de Execução Penal (LEP).
A coordenadora do Caocrim, promotora de Justiça Isabelle Figueiredo, destacou que o objetivo do evento foi promover um debate aprofundado sobre a atuação criminal no estado, buscando promover a aplicação de uma pena justa. Isso significa garantir a reparação às vítimas que buscam uma atuação eficiente do Estado e, simultaneamente, assegurar a atenção devida aos apenados nas unidades prisionais, reforçando o compromisso do Ministério Público com ambas as partes.
A iniciativa visou capacitar os membros e servidores do Ministério Público, por meio da troca de conhecimentos e experiências, inclusive internacionais, para que possam atuar de forma mais eficaz e alinhada às necessidades da sociedade.
Representando o procurador-geral de Justiça, Abel Leal, o chefe de gabinete, promotor de Justiça Juan Aguirre, destacou que o evento foi de extrema importância para o debate sobre a efetivação da justiça, especialmente na área da execução penal. "A relevância do encontro reside na oportunidade de promover discussões cruciais, garantindo que o papel constitucional da justiça seja sempre pautado pela dignidade da pessoa humana", ressaltou.
Reavaliando a pena: ressocialização em foco
A discussão central do simpósio girou em torno da finalidade da pena: ela deve apenas punir ou também ressocializar? A experiência de Portugal, focada na dignificação da pena privativa de liberdade através da capacitação e do trabalho prisional, foi apresentada como um modelo inspirador. O jurista e pesquisador Marco Ribeiro Henriques, em sua palestra, levantou questões sobre as consequências do trabalho prisional e das políticas de reinserção social, contribuindo para um debate mais aprofundado e para a busca de soluções mais humanas e eficazes frente aos desafios do sistema penitenciário, apresentando o modelo europeu. Ele defende uma abordagem que veja a prisão não apenas como um local de punição, mas como uma oportunidade para a reabilitação e a construção de um futuro mais digno para os indivíduos privados de liberdade.
No Brasil, no entanto, a realidade é mais complexa. O coordenador da Unidade de Monitoramento da Execução das Penas e Medidas de Segurança do Ministério Público da Bahia (MPBA), promotor de Justiça Edmundo Reis, durante sua palestra, apontou a sobre-representação de afrodescendentes nos presídios, uma triste evidência de um processo histórico de exclusão. A superlotação carcerária, a escassez de oportunidades de trabalho e educação, bem como a precariedade da assistência à saúde são obstáculos que, de acordo com ele, precisam ser superados para a ressocialização efetiva.
O desafio da saúde mental no cárcere
Outro ponto crítico debatido foi a situação de sentenciados em medida de segurança com tratamento ambulatorial que não aderem à terapia. A mudança na política de saúde mental, que agora restringe internações a casos de surto, levanta a necessidade urgente de alternativas e de uma atuação mais eficaz da Equipe de Atenção Psicossocial (EAP), em conjunto com a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). A falta de estrutura e o difícil acesso a recursos como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) dificultam o acompanhamento desses indivíduos, aumentando os riscos para a comunidade.
Propostas como a criação de uma central de medida de segurança e a melhoria da EAP são vistas como essenciais para garantir o acompanhamento adequado e a construção de um Plano Terapêutico Singular (PTS) para cada paciente, inclusive com a articulação em casos de recusa de medicação e o envolvimento da Polícia Militar, se necessário.
Responsabilidade coletiva
Os debates ressaltaram que a sociedade precisa compreender a finalidade da pena e enxergar a prisão como uma oportunidade de reintegração. A reintegração de pessoas em privação de liberdade é responsabilidade de todos: da comunidade local, das empresas e do próprio Estado. A necessidade de capacitações cruzadas e o reconhecimento de que o investimento em reinserção social pode ser financeiramente mais vantajoso do que a simples ampliação de vagas são pontos-chave para uma mudança de paradigma.
Em suma, o simpósio do MPTO reforçou que, embora existam indivíduos que persistem no crime, o Estado e a sociedade não podem se eximir de oferecer possibilidades de ressocialização. A efetivação da LEP, a humanização do sistema prisional e o investimento em programas de reintegração são passos urgentes para construir um futuro mais justo e seguro no Tocantins e em todo o Brasil.
Texto: Shara Alves de Oliveira/ Cesaf-ESMP